quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
O azul rúbeo
Todo o encanto que bebeu meu sangue,
vertendo a oferta da alma em sujo chão,
resta na seca carne, pálida, vagante na sede
de um dia se encontrar no vermelho que resta.
E, ébrio de Nada, desfaço-me nos rastros da andança
que dia algum existiu, indagando ao céu quaisquer auroras.
O vasto azul esvai-se vazio no tropeço da minha surdez de querer,
que escorre a dor a tingir a terra e rasgar os pés já secos de norte.
A visão perde-se na mistura das cores, na aquarela trágica do [pôr-do-sol,
e o ar mata a última gota de vida a agonizar num corpo esquecido [de lágrimas.
O silêncio prolonga-se na aridez de só o vácuo enxergar.
No cromatismo da morte, alma e sol se vão, mentindo o mito do [Retorno
enquanto meus olhos, cegos, secos, encerram-se, como o peito.
Que se esquece na noite eterna.
Que se perde na infinda espera.
*Clique no nome do poema de Manuel María para lê-lo e ouvir sua versão musicada.
sábado, 19 de fevereiro de 2011
Despedida do navegante
“Dois navegantes perdidos no cais...”
Lenine, em Distantes Demais
Lenine, em Distantes Demais
Não sou a calma para que deites teus olhos:
aqui estou, mas as tormentas do Agora
vibram os velames frágeis de meu andar.
Veja as águas sem terras, sem ao menos ilhas ignotas.
Sinta o vento em ti uivar o choro da erma odisseia
que de ti me cortas e onde afundo, surdo por sereias.
Não faças desta podre proa teu horizonte, pois, fatal
e constante, o Tempo a afunda. E te inundará com as
lágrimas que carregas – o mar onde nunca poderei navegar.
De ti ficaram os pés descalços na primeira areia em que pisei:
ficou o punhado que trago num mar sem Norte, sem futuro.
Porém são as águas que me embebedam, nômade.
De mim não deixo mais do que essa gota de maremoto, essa
maresia a turvar teu ar e teu peito. E me despeço, triste,
no impossível de dar-te a maior bonança, que em mim se ausenta.
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