segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Mênade



É o Inferno que veste tua voz amarga

e destoa da garganta o suspiro doce.
Se guardas o nó da fúria no fôlego que falta,
afoga-te nessa tormenta de silêncios.

Tire da tua mão a ridícula inquisição
do pecado que apenas teu dedo aponta.
Limpe dos olhos as lágrimas que borram
a falsa inocência de teu ínfero fogo.

Vire a tua cara para a distância, a maior:
ausente, marca alguma em ti deixarei.
Teu ódio é ver no Sul o Norte, encruzilhada
de tragédias, recuando ao abismo claro

do teu desejo turvo que no “Se” evapora,
fazendo-te inalar o cianeto trazido no pó
da estrada que segues, cega, apodrecendo
no que nunca terás e no que, maldita, me tiras!



sábado, 8 de janeiro de 2011

A cama órfã



O vento a ferir de frio o triste peito

grita o coro errante da noite longa.
E ela – vejo! – a dançar o intocável
no sopro da eterna madrugada.

A cama velha range a insônia
de quem no silêncio se encobre.
O uivo vindo da janela geme
o pesadelo, que ao meu lado pousa.

E ela, vaga, desliza pelas folhas secas,
pelas gotas cadentes, pela vida a gelar,
despedindo-se no último tremor a me tocar,
a despertar-me pro trágico agora do Nada.

Cobre-me o véu noturno do sonhar
enquanto nina longe meu mais doce sentir:
meu berço entoa a cantiga surda do nome
que em corpo jamais em mim deitará.