quarta-feira, 16 de junho de 2010

Fora


À Julianne Caribé


Cambaleando em passos tropeçados, em direção à porta. Uma cortante maçaneta se vestia de algemas para aquela estranha cadeia, de janelas convidando estrangeiras luzes para dentro. Aldo, num incontrolável desespero por conta dos passos dados pelo Fora-da-casa, fere-se ao tentar trancá-la. Nunca ele chegara tão perto da entrada. Sem esperar resposta, Fora-da-casa consegue vencer a navalha-chave que barrava o recado que o tapete dava nos dizeres “bem vindo”, colocado nos tempos de construção da fundação da casa. Estancando o sangue frio que avermelhava as mãos suadas de terror, Aldo arrasta-se nas sobras de sombras que restavam pela casa, acreditando, como criança a se cobrir dos pés à cabeça em sua cama numa noite chuvosa, estar protegido do que ele não vê. Não vira o rosto que invadiu, sem chaves ou campainhas, a casa. Perseguido por um medo sem face, íntimo e estranhamente tentador. Os olhos de Aldo buscavam Fora-da-casa, que se acobertava na luz extremamente forte que tomava a casa, como se as janelas tivessem se tornado varandas. Os olhos, sempre dilatados e receosos por conta da vida noturna da casa, queimavam no claro amarelo que definhava, cada vez mais, penumbras esgueiradas por frestas, cantos, quartos e vazios.

Mas estava escondido. Seguro. Nada o atingirá. Não havia como ser visto naquele último canto de seu lar, onde luz alguma chegou. Assim pensava Aldo quando, delicadamente, uma mão o toca no ombro. Dilatando temor, inação e fragilidade, Aldo olhava atentamente para Fora-da-casa, tentando (re)conhecer quem estava em sua frente. Mas uma estranha sombra encapuzava Fora-da-casa, única sombra que, agora, existia na casa.

Tomando a mão de Aldo, Fora-da-casa leva-o para a porta, fechada, afastando-se da entrada com alguns passos. Na maçaneta ainda se via o encrespado sangue seco de Aldo, capa que servia agora de proteção para que ele abrisse a porta. Hesitando passos num chão descalço de um homem antes trancado, Aldo segue, na tonteante luz que o ofusca, mas atrasa o passo seguinte. Olhando para trás, vê sua face desenhada em Fora-da-casa, que, expressando uma desconfortante melancolia, entra na casa, trancando-se.



3 comentários:

  1. tranca a porta que é ladrão...nunca se sabe o que eles podem roubar

    ^^

    se eu entendesse bem de palavras,assim como esse pessoal das letras, eu pegaria um punhadinho e dedicaria a vc...algo assim...que te fizesse sair e ver o mundo =]

    não tranca ngm la não...

    "Sem querer eles me deram
    As chaves que abrem
    Essa prisão
    E tudo ficou tão claro
    O que era raro, ficou comum
    Como um dia depois do outro
    Como um dia, um dia comum..."

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